Vamos imaginar que estamos em um país cuja taxa de juro básica é de 0,25% (não, essa não é a alta da Selic, é a taxa de juros efetiva). Neste mesmo país, a moeda está se desvalorizando todo dia ao longo dos últimos dois anos. E, apesar de tudo isso, do choque dos preços do petróleo, das altas dos alimentos no mundo, a inflação está ao redor de 3% ao ano. Parece muito bom para ser verdade. Esse país existe e são os Estados Unidos. O único problema é que todo esse cenário está inserido em um quadro maior de recessão e de estouro da bolha de ativos, principalmente no mercado imobiliário. Isso explica, pelo menos em parte, porque com moeda fraca, juros baixos e pressão nos preços internacionais a inflação não chega.
Mas o cenário norte-americano não explica totalmente porque a inflação segue baixa lá. A confiança na moeda e na solução de problemas pelas vias ortodoxas garante uma outra parte dessa “trégua inflacionária”. Tanto que, neste momento, o presidente do Federal Reserve (FED – o Banco Central americano), Ben Bernanke, está pedindo ao Tesouro dos Estados Unidos que pare de recomprar títulos que monetizam o mercado. Em português mais claro, o presidente do FED quer manter as taxas de juros baixas e ainda assim o controle inflacionário. Para que isso ocorra com a moeda fraca, é preciso que o Tesouro colabore e pare de encharcar o mercado de dinheiro. Essa preocupação é bastante familiar aos leitores desse boletim. O procedimento – ou a estratégia, se preferir – de recompra dos títulos foi adotado ao final de 2008, como forma de reduzir o impacto da recessão mundial, que tinha seu epicentro nos Estados Unidos mesmo. Também esse fenômeno nos é familiar. Lá, nos Estados Unidos, apesar da enorme dívida pública, a preocupação de fato é a evolução dessa dívida e a atuação do Tesouro.
O mais interessante é que as preocupações com o excesso de liquidez começaram antes de haver pressão inflacionária. Isso quer dizer que o presidente do FED está antevendo que juros baixos e gastos públicos elevados (políticas fiscais e monetárias frouxas) acabarão por trazer esse monstro para dentro de casa. Aqui, o governo manteve a política de gastos elevados, de incentivo ao consumo através de sua política fiscal frouxa por mais tempo do que o que deveria ter feito. Estamos atrasados, correndo atrás da inflação e, nos Estados Unidos, o excesso de dinheiro no mercado ainda não trouxe alta de preços, mas, como esse seria um efeito possível, já começam a tomar providências. Seria muito bom começarmos.
Em outros boletins, já alertamos para o fato de que, com a política fiscal fora do eixo, é bem possível que no segundo semestre deste ano estejamos amargando resultados econômicos (produção industrial e vendas no varejo) negativos e ainda convivendo com inflação alta. Se hoje a vida nos Estados Unidos não é boa por conta do fraco nível de atividade, imaginem o que será a nossa com o nível de atividade caindo e com a inflação para nos acompanhar?
Assessoria Técnica
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