sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Explorando um pouco o mercado de crédito no Brasil - 1

O mercado de crédito no Brasil ainda não pode ser comparado aos mercados mais maduros, apesar de seu recente desempenho invejável, se comparado a outras economias até mais avançadas. Invejável sob o conceito de crescimento e também de controle de riscos. Também bastante pródigo nos últimos anos em melhorar o perfil do endividamento, com redução média de juros e, mais importante, a troca de dívidas velhas por novas mais alongadas e adequadas ao consumo de duráveis e imóveis para a pessoa física e para o investimento da pessoa jurídica.

Desde o final de 2008, boatos sobre o risco do sistema de crédito brasileiro são suscitados. História de bolha de crédito no setor de automóveis, com uma eventual emulação do efeito subprime nesse segmento, super endividamento das famílias, risco de crédito em bancos médios e daí por diante. O maior inimigo desses boatos são os fatos. Em quase três anos ininterruptos de boatos, nem mesmo os dados de inadimplência deram um fôlego aos boateiros e catastrofistas de plantão.  A manterem essa postura, é provável que um dia algum analista acerte, mas pelos motivos errados. Por enquanto, os dados sugerem que não há um risco de default (calote) generalizado das dívidas da mesma forma em que a mera sugestão de que há uma bolha de crédito no sistema financeiro brasileiro carece de um mínimo de subsídios conceituais e factuais.
Uma bolha de crédito se caracteriza em primeiríssimo lugar por ocorrer em um mercado em que o juro é mantido artificialmente e por um longo período muito abaixo do que o equilíbrio de mercado sugere. Esse foi o caso americano onde as taxas de juros para financiamentos, principalmente o imobiliário, que é muito alavancado e longo,  ficaram muito baixas, por anos, estimulando consumidores a adquirir o que não era necessário e nem estaria ao seu alcance em condições normais. Esse fenômeno gerou um super consumo, principalmente de imóveis, que, por sua vez, gerou uma supervalorização. Essa corrente de mais vendas mais preço e mais preço, mais financiamento, parecia que nunca acabaria. Nada como uma crise cíclica de crescimento e emprego para colocar todo esse castelo à prova, e o resultado todos nós sabemos.

No Brasil, dizer que existe uma taxa de juros artificialmente baixa, quando a Selic ronda os 13% e a PF em média paga quase 50% de juros ao ano, é desconhecer o significado da palavra “baixo”. O mesmo vale para as empresas que tomam empréstimos a mais de 30% em média.  Além disso, as garantias exigidas são enormes e, mais importante, praticamente não existe financiamento de bens de elevado valor (casas, carros ou aquisição de estoques) sem que o financiado já pague uma parcela de 20% ou 30% na forma de adiantamento. Essas condições  também descaracterizam completamente o conceito de bolha e reduzem sumariamente o risco de inadimplência sistêmica (e voluntária como a americana).
Não conseguimos entender o porquê de muitas publicações darem muito espaço para essas teses que ou são produto de desconhecimento ou um quase desejo mórbido de acertar a catástrofe. Nos preocupamos sempre em manter o grau de informação técnico elevado e dar a esse boletim o caráter informativo e simples, não simplório. Nos preocupamos em dar o maior grau de informações ao nosso leitor, sem grandes pretensões de guiá-lo. Muitos indicadores de inadimplência têm sido divulgados de forma absoluta, ou seja, o volume de dívida não paga cresceu entre maio de 2010 e maio de 2011, por exemplo. Isso é um fato, mas acontece que o volume de empréstimos também subiu e a inadimplência é e deve ser um dado relativo, ou seja, se o volume de empréstimos estiver subindo mais do que o das dívidas não pagas, na prática a inadimplência está caindo. Nestes últimos dois anos, segundo dados do BC, a inadimplência se mantém estável e até com uma leve tendência de queda, que por vezes oscila um pouco para cima, um pouco para baixo.

Isso não quer dizer que não vejamos riscos no mercado de crédito. Vemos sim, só que são aqueles que fazem parte do jogo. Em uma negociação de financiamento, ninguém sai impune: o consumidor que se descontrolar, exagerar nas compras e não pagar, vai ter seu nome incluído em uma lista negra, e por mais que digam que nada acontece, vai sentir os efeitos de ter o nome sujo na praça. O vendedor que financiar irresponsavelmente, vai ver o que acontece com seu balanço e com as provisões para devedores duvidosos. Vai custar no seu bolso entregar a mercadoria e não receber o pagamento. Não é bom para ninguém ignorar esses conceitos, mas uma coisa é o risco normal, outra coisa é o alarde de um risco sistêmico se avizinhando, há mais de três anos, e que nunca chega.
Assessoria Técnica

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