sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Nós, os latinos

Os brasileiros têm uma forte influência da cultura latina. Muitos de nós descendemos diretamente de italianos, portugueses e espanhóis. Os italianos, por sua vez, são os representantes atuais do berço da cultura latina, romana, no mundo. Atualmente, nossas semelhanças com a Itália terminam por aí.

A menos de 15 dias, o Brasil emitiu títulos de longo prazo (30 anos) no mercado internacional com taxa de juros inferior a 4,7% ao ano. Nesta semana a Itália lançou títulos para financiar sua dívida, de prazo bem mais curto (entre um e dois anos) e pagou juros de quase 7,4%. Ironicamente, a inversão óbvia de papéis na economia também está explícita na inversão dos algarismos dessas duas emissões de títulos. Hoje, o que explica essa diferença, a favor do Brasil, é a situação política e econômica (se é que uma pode ser em algum momento desvinculada da outra). Politicamente, a situação italiana dispensa maiores explicações para que o leitor entenda porque o Brasil está melhor. Em termos econômicos, o caso também é simples de entender: o Brasil está crescendo muito mais do que a Itália, a dívida pública nacional é proporcionalmente menor do que a metade da dívida italiana e somos um dos maiores players no mercado de commodities, que está muito aquecido, a despeito das crises dos países desenvolvidos.
Bom, se temos uma situação tão melhor do que a italiana hoje (e temos) a ponto de nos financiarmos externamente com taxas muito mais baixas, o que explica que internamente não consigamos fazer o governo rolar seus papéis com juros abaixo de dois dígitos? Parece que o presidente do Banco Central está se fazendo a mesma pergunta. Existe uma espécie de mito no Brasil que coloca um piso nas taxas de juros internas, abaixo do qual, o caos se instalaria, na forma de inflação, desintermediação etc. Se isso fosse verdade, porque os financiadores externos não percebem o risco brasileiro da mesma forma que nós mesmos? E não dá para colocar a culpa deste diferencial (entre 4,7% e 12% nas taxas de longo prazo nos financiamentos externos e internos) na variação cambial. Se o câmbio estava apontando para algum lado, é para a valorização, ou seja, a taxa interna deveria ser ainda menor.

Parece que o presidente do BC, Alexandre Tombini, também percebeu que não há monstros debaixo da cama. Que nada demais vai acontecer se a Selic cair gradualmente. Talvez cheguemos ao final de um ou dois anos com taxas internas de 5% ou 6% (ainda serão maiores do que nas economias desenvolvidas) e venhamos a nos perguntar por que ficamos tanto tempo gastando uma montanha de recursos pagando serviços da dívida. A Itália gasta mais de 140 bilhões de euros ao ano com a rolagem de suas dívidas hoje. Os brasileiros, entre o que pagam na rolagem da dívida bruta e o que recebem de juros nos ativos, de forma geral, gastam quase 100 bilhões de euros. Não faz o menor sentido hoje uma dívida menor do que a metade da italiana custar 2/3 do que pagam os nossos amigos europeus, devido a todas as circunstâncias já expostas. Seguem os números - arredondados - de nossas dívidas e ativos e seus custos e receitas.


De forma grosseira, o Brasil gasta em média 11% de juros para rolar sua dívida bruta, que é de 60% do PIB. Como o País tem cerca de 20% de ativos investidos, há uma receita. Fazendo as contas, o Brasil paga R$ 264 bilhões de juros e recebe R$ 32 bilhões, o que perfaz R$ 232 bilhões de juros pagos. Se olharmos direito para essas contas veremos que, em média, o Paísl gasta mais de 14% para rolar suas dívidas por conta de um efeito contábil interessante: temos R$ 800 bilhões em ativos aplicados a uma taxa baixa, mas temos que pagar taxas elevadas para uma dívida bruta de 60% e não apenas 40% do PIB. Ou seja, liquidamente a dívida é de R$ 1,6 trilhão e os custos de R$ 232 bilhões. Seria mais fácil usar os ativos para quitar dívidas mais caras.
Independentemente disso, se estimarmos que o País mantenha a rota de queda nos juros nos próximos dois anos, e que ainda assim não altere suas aplicações dos ativos,  passaria a gastar R$ 112 bilhões, ou R$ 120 bilhões a menos de juros: 3% do PIB. Somente essa redução tornaria o Brasil superavitário no conceito de saldo nominal. Podemos imaginar o que isso significaria em termos de aumento de capacidade de investimentos e estímulo direto e indireto à produção.


Assessoria Técnica

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